sexta-feira, 7 de agosto de 2009

70 anos da 1.a gravação de “Strange Fruit”

Além dos 50 anos sem Billie Holiday, o que vai valer um Tributo à cantora dentro do Festival de Jazz de Ouro Preto, Tudo é Jazz, Ano 8, que acontecerá nos dias 18, 19 e 20 de setembro de 2009, o Festival terá outra efeméride que precisamos comemorar: os 70 anos da gravação de “Strange Fruit” por Billie Holiday.

A Commodore revelou-se decisiva para Billie Holiday, porque foi a única que aceitou correr o risco de gravar "Strange Fruit", em abril de 1939, manifestação aberta da luta dos negros americanos pelos direitos civis. O crítico Ralph Gleason gostava de dizer que Billie só era feliz quando cantava. E não resiste à metáfora: “Quando não cantava, ela era a representação viva das palavras de "Strange Fruit", não pendurada numa árvore mas nos galhos da própria vida.” A música falava de das estranhas frutas que pendiam dos álamos do sul, corpos negros e o cheiro de sangue no ar.

Letra:

“Southern trees bear strange fruit,
Blood on the leaves and blood at the root,
Black bodies swinging in the southern breeze,
Strange fruit hanging from the poplar trees.
Pastoral scene of the gallant south,
The bulging eyes and the twisted mouth,
Scent of magnolias, sweet and fresh,
Then the sudden smell of burning flesh.
Here is fruit for the crows to pluck,
For the rain to gather, for the wind to suck,
For the sun to rot, for the trees to drop,
Here is a strange and bitter crop”
“As árvores do sul dão um estranho fruto,
Sangue nas folhas e sangue na raiz,
Corpos negros balançando à brisa do sul,
Estranhos frutos pendurados nos álamos
Cena pastoral e galante sulista,
Os olhos saltados e a boca torcida,
Perfume de magnólias, doce e fresco,
E então o repentino cheiro de carne queimando.
Aqui está a fruta para os corvos depenarem,
Para a chuva enrugar, para o vento sugar,
Para o sol apodrecer, para as árvores derrubarem,
Esta é uma estranha e amarga colheita”.
(Tradução: Clarissa Passos)


Embora soe como um cenário fictício, os versos foram escritos por um professor judeu e branco do Bronx, NY, e eram inspirados em acontecimentos reais.
Em 1939, Billie Holiday teve um pequeno conflito com sua gravadora, a Columbia, porque queria gravar uma canção composta por um tal de Lewis Allan (pseudônimo do professor judeu autor de “Strange Fruit”). Depois de muita discussão, ficou decidido que a já aclamada cantora obteria uma licença para gravar a música em outra gravadora, a pequena Commodore - cujo dono, Milt Gabler, começou a chorar feito criança depois que Billie cantou para ele uma versão à capella da música.
No mesmo ano, em um compacto 78 rpm, saía “Strange Fruit”. A música fez um sucesso estrondoso; era o ponto alto (e final) dos shows de Lady Day. Todas as luzes se apagavam e apenas um foco de luz era aceso sobre a cantora; daí ela desfiava os versos tristes sobre aquele cenário de horror no sul.
E os versos ficam mais tristes ainda quando sabemos que a canção, composta por Abel Meerpool (o professor judeu que usou o pseudônimo de Lewis Allan), foi inspirada por uma fotografia chocante, muito chocante.
A foto foi tirada em 7 de abril de 1930, quando uma multidão linchou Thomas Shipp e Abram Smith, ambos de 19 anos, em Indiana - e por pouco não pegou um terceiro rapaz, chamado James Herbert Cameron, 16. Os três, negros, foram acusados de roubar e matar um homem branco e estuprar a namorada dele. Antes que recebessem um julgamento, foram mortos e pendurados pela multidão.
Os linchamentos eram bem comuns em certas áreas dos Estados Unidos desta época - especialmente de homens negros acusados — ou não — de crimes contra brancos. Também eram usados como uma forma de amedrontar os negros e mantê-los longe das urnas e de qualquer exercício de seus (poucos) direitos de cidadãos. Depois que o fotógrafo Lawrence Beitler registrou a cena que inspirou a música “Strange Fruit” (e vendeu milhares de cópias desta mesma fotografia a 50 centavos de dólar cada), no entanto, eles deixaram de acontecer. Terá sido o impacto da música?
James Cameron escapou vivo, escreveu a auto-biografia “Time of Terror: A Survivor’s Story” (“Tempo de Terror: a História de um Sobrevivente”) e fundou o Museu Americano do Holocausto Negro, que, nas palavras do próprio site da instituição, se propõe a “educar o público sobre as injustiças sofridas por pessoas de ascendência negra, além de proporcionar aos visitantes uma oportunidade de repensar suas suposições sobre raça e racismo”. Ele existe até hoje em Milwaukee, Wiscosin, EUA.

2 comentários:

  1. quem gravou strage fruit antes de billie??

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  2. Prezado Mateus,
    Pelo que estudei, quem GRAVOU primeiramente Strange Fruit foi Billie Holiday, na Commodore uma gravadora de jazz alternativo do amigo dela, Milt Gabler em 1939.

    A música foi CANTADA para o público, antes da gravação de Billie, no Madison Square Garden, pelo professor (branco e judeu) Abel Meeropol, autor da música, e sua esposa e vocalista negra, Laura Duncan em 1936.
    O fundador do "Cafe Society" no Greenwich Village em NY, primeiro club de jazz interacial da cidade,apresentou a música à Billie que a cantou pela primeira vez neste clube em 1939.

    Depois, outros gravaram a música:
    Nina Simone, 1965
    UB40, 1980
    Tori Amos, The Cocteau Twins, Diana Ross, Cassandra Wilson e outros mais.

    Maria Alice Martins

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